sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Eu só penso em comida quando estou com fome

Quando era criança, era só sentir fome e comida aparecia. Acordava faminto, escovava os dentes rapidinho e corria pra cozinha. Lá estava a mesa posta: o pão quentinho com manteiga e o café com leite. Minha mãe dizia que um homem nem dormira à noite pra fazer aquele pão. E que ela levantava cedinho e ia à padaria, depois passava o café e fervia o leite.

Depois de tomar café, eu ia pra escola, ou ia brincar ou ver tv, se fosse sábado ou domingo. Algumas horas depois a fome ressurgia. Eu corria pra cozinha e lá estava a mesa posta: o feijão cheiroso, o arroz quentinho, as batatas fritas e a carne assada. Como num passe de mágica... eu pensava e comida aparecia.

Mas minha mãe dizia que na noite anterior, depois que a gente dormia, ela escolhia o feijão e deixava de molho. De manhã cedo, enquanto preparava o café, ela tirava a carne do congelador e colocava o feijão pra cozinhar. Depois de tirar a mesa do café e lavar a louça, ela descascava as batatas enquanto via tv. E entre uma limpeza e outra, preparava a carne, verificava a panela de pressão. Entre um telefonema e outro, verificava o arroz e a carne no forno. E, quase na hora, parava tudo e fritava as batatas. Então, arrumava a mesa e gritava: "Crianças, vêm comer!"

Minha mãe achava que eu não entendia e tentava explicar como a mágica acontecia. Mas eu dizia: "Mãe, não precisa inventar coisas. Eu sei como acontece. Eu penso e aparece." E a mágica se repetia dia após dia, ano após ano. Tinha fome, pensava na comida e ela aparecia. E, assim, saciado crescia.

Um dia, já homem crescido, saí de casa. Fui cuidar da minha vida. Acordava sempre em cima da hora e, enquanto tomava banho, o pão ainda estava na padaria, o leite na geladeira e o café ainda era pó. E se eu não fizesse nada, lá eles ficariam. Então, depois de tomar café, seguia.

Algumas horas se passavam e a fome voltava, me lembrando de que comer era preciso. Mas a carne estava no freezer, o feijão no armário e as batatas não havia. Faria um miojo, mas o gás depois de seis meses acabava de repente. Só me restava achar um McDonald's.

Minha mãe tinha razão. A vida é um processo. E isso é incrivelmente mágico!

5 comentários:

Anônimo disse...

Verdade... bora trabalhar então! Abraço

Bianca disse...

Haha...
E eu tenho saudades da mágica!

Quando fui morar sozinha o que eu lembro de ter "descoberto" foi que depois que as lâmpadas queimam, elas não reaparecem acesas. =/

Abração!

Maria Luiza Pereira disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fernanda. disse...

Gil, os bifes(por aqui) estão para fritar....=/ quero a mágica de volta! =p

Petruska disse...

Adorei este trecho: "Um dia, já homem crescido, saí de casa. Fui cuidar da minha vida. Acordava sempre em cima da hora e, enquanto tomava banho, o pão ainda estava na padaria, o leite na geladeira e o café ainda era pó." Gargalhadas e mais gargalhadas!!! =D